Querem saber
se criança tem zumbido? Siiiiiiiim! Se vocês nunca viram uma delas,
provavelmente vão duvidar... mas vamos aos argumentos:
A) Tive a
oportunidade de orientar o doutorado da Dra Cláudia Coelho que, junto com a
fono Sandra Weber, testaram 506 crianças de 5 a 12 anos, em escolas públicas ou
privadas no interior do Rio Grande do Sul. Sabendo que crianças têm tendência
de gerar falsos positivos para agradar os examinadores, nosso questionário tinha
3 critérios de rigor para considerarmos que uma criança da pesquisa tinha
zumbido. Ela tinha que: 1) responder SIM para a pergunta "você ouve algum
barulhinho nos seus ouvidos quando está tudo em silêncio?"; 2) saber
descrever COMO era o som; 3) saber descrever ONDE o ouvia (lado do ouvido ou
cabeça). Ficamos surpresas de constatar que 37% dessas 506 crianças tinham a
percepção de zumbido (Coelho CCB, Sanchez TG, Tyler R. Tinnitus in children
and associated risk factors. Prog Brain Res. 2007;166:179-91).
B)
Depois dessa experiência, meu pensamento era "se as crianças têm mais
zumbido do que o percentual obtido nas pesquisas de prevalência na população
geral - que nem incluem crianças! - então, os adolescentes também devem
ter!". Lá fomos nós buscar essa resposta... na pesquisa com 170
adolescentes de 12 a 17 anos, vimos que: 1) usando um questionário como
instrumento para saber a resposta à pergunta "você tem ou teve zumbido nos
últimos 12 meses?", constatamos que 54,7% deles responderam SIM, além de
terem esclarecido como era o som, onde o percebiam (ouvidos ou cabeça) e em que
situações ele aparecia; 2) quando colocados dentro da cabina acústica para
medir a audição, 28,8% deles também foram capazes de fazer acufenometria (medida
da frequência e intensidade do zumbido) porque o estavam percebendo naquele
preciso momento! Resumindo: mesmo considerando apenas a taxa de zumbido obtida
dentro da cabina (que foi o trunfo desse trabalho), DE NOVO vimos uma
prevalência de zumbido muito maior do que a relatada nos estudos com a
população geral. Esse trabalho completo até foi dividido em duas publicações: Sanchez TG, Oliveira JC, Kii MA, Freire K, Cota J,
Moraes FV. Tinnitus in
adolescents: the start of the vulnerability of the auditory pathways. Codas. 2015;27(1):5-12 e Sanchez TG, Moraes FV,
Casseb J, Cota J, Freire K, Roberts LE. Tinnitus is associated with reduced sound
level tolerance in adolescents with normal audiograms and otoacoustic
emissions. Sci Reports, no prelo).
Então,
se zumbido é mais comum do que o esperado em crianças e adolescentes, por que eles
não chegam aos nossos consultórios? Simples! Ficou claro que eles não têm
incômodo e nem contam aos pais - geralmente porque acham que “é normal” ou que
“todo mundo tem” ou porque dormem com a TV ligada. Com isso, existe uma
habituação/adaptação espontânea ao
zumbido nessas faixas etárias, gerando menos repercussão negativa na qualidade
de vida (esse é o lado bom da coisa ruim). Por outro lado, deixar de investigar
a tratar precocemente são os fatores primordiais para incentivar a cronicidade,
tornando uma boa resposta a um eventual tratamento potencialmente mais difícil
no futuro.
Para finalizar,
faço um convite a vocês: que tal incluir uma perguntinha básica na anamnese de
crianças ou adolescentes: “Você ouve algum som nos seus ouvidos/cabeça quando
está tudo em silêncio?”. Isso é válido para otorrinos, fonos, pediatras,
hebiatras, psicólogos, etc. Eles conseguem ser bem precisos nas respostas e
certamente avançaríamos mais nesse tópico intrigante.
Muito bom o artigo, esclareceu várias dúvidas que eu tinha sobre o assunto de modo bem simples.
ResponderExcluirAgradecemos o seu comentário.
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